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1996
Quarta-feira, dezessete de abril,
Eldorado dos Carajás, Sul do Pará, Brasil,
Lá onde só Deus sabe o que acontece,
PA 150, Curva do "S",
Por mais de um dia 1200 sem terra
Bloqueiam a rodovia, reivindicam à sua maneira
A desapropriação da fazenda Macaxeira.
40 mil hectares de um só dono
De uma terra entregue ao abandono
Grande propriedade, latifúndio improdutivo
Que só serve ao interesse especulativo
E o fazendeiro que não faz concessão
Está disposto a abrir mão
A 800 famílias que só sonham com um pedaço de chão.
E tentam a todo custo se manter de cabeça erguida
Mesmo famintos e lutando por comida
Gente simples, pobre sem muito recurso,
Cansados de esperar reforma agrária sair do discurso
Tudo que eles querem é a terra pra poder fazer uso
INCRA não dá crédito, não assenta, não cumpre
prazo,
governo age com total descaso,
Insensibilidade diante do drama
E um profundo desprezo pela vida humana.
Planejam o que ninguém imagina
Enquanto a hora da matança se aproxima
Refrão
Sem justiça não existe paz
Não existe paz
Eldorado dos Carajás
Sem justiça não existe paz
Não existe paz
Eldorado dos Carajás.
De Paraupebas, de Marabá
Vieram dois destacamentos da Polícia Militar,
Coronel Mário Pantoja,
Com a sua corja,
Duzentos homens armados de forma ameaçadora,
Com revólver, escopeta, fuzil, metralhadora.
Chegaram na surdina, com sutileza
Prontos pra partir pra cima de gente indefesa
Sedentos de sangue e ao que tudo indica
Vão usar uma violência que não se justifica
São ossos do ofício, matar faz parte do serviço
A tensão aumenta, todo mundo se sente apreensivo,
Cada segundo conta, cada minuto é decisivo.
Mas der no que der
Os sem-terra não vão arredar o pé
Estão dispostos a resistir enquanto puder
Enquanto o Sr. Almir Gabriel
Só tá a fim de defender o latifúndio, o gado e o capim
A sua ordem tem tom de ameaça
Custe o que custar, de hoje não passa.
Refrão
Sem justiça não existe paz
Não existe paz
Eldorado dos Carajás
Sem justiça não existe paz
Não existe paz
Eldorado dos Carajás.
E do ímpeto a polícia agiu do seu jeito,
Foi traiçoeira, sorrateira, covarde,
Às quatro e meia da tarde,
Tempo esgotado
cerco se fecha,
Os pau-mandados
Não deixaram brecha.
Reagir, bem que os sem-terra tentaram
Mas aí, é claro,
Este foi o pretexto usado
Para o primeiro disparo
Daí pra frente o que se viu
Foram execuções a sangue frio
Cenas de uma guerra civil.
A crueldade sem limite
Com todo seu requinte,
Porque contra força
Não existe argumentos
Ainda mais quando se trata
De um esquadrão de fuzilamento.
Foram quatorze minutos contados de fogo cerrado
Chumbo grosso, osso,
No meio daquele alvoroço se ouvia choro e grito
Das pessoas que tentavam fugir do conflito
Foi um corre-corre, um Deus-nos-acuda,
Pessoas desesperadas imploravam ajuda.
E o pior é que existe indícios
Que tudo foi premeditado
Desde o início
Todas as balas tinham endereço certo
E os tiros, foram todos dados de muito perto
Parecia coisa de grupo de extermínio seu menino
Não importava quem estivesse no caminho.
Homens, mulheres, crianças, dava tudo no mesmo
Porque os homens atiravam impunemente a esmo.
À torta e à direita, sem dar a mínima,
Sem escolher a vítima,
Lourival não conseguiu correr,
Ficou parado, confuso, levou um tiro de fuzil no peito,
Caiu morto de bruços.
Robson foi arrastado pelo cabelo
E não foi culpado.
Mesmo depois de já ter sido dominado
Oziel tinha sido jurado de morte pelos coronéis
Foi algemado, espancado com socos e pontapés,
Depois recebeu três tiros fatais
E teve o mesmo triste fim que os trabalhadores rurais.
Naquela batalha campal cujo resultado final
Foram dezenove mortos e sessenta e um feridos no total,
Todos vítimas da ação policial que foi brutal, violenta
e sanguinária.
Promoveu execuções sumárias, uma tragédia parecida
Com a da Candelária, Carandiru, Vigário Geral, Corumbiara.
E Eldorado dos Carajás é um caso a mais
Que revela realmente do que ela é capaz
Julgou a opinião pública nacional
Causou repercussão internacional
Mas depois de um certo tempo
Caiu no esquecimento
Deve ser por isso que ninguém fica surpreso
Que até hoje nenhum dos acusados tenha sido preso.
Refrão
Sem justiça não existe paz
Não existe paz
Eldorado dos Carajás
Sem justiça não existe paz
Não existe paz
Eldorado dos Carajás
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Esta música é do CD
Um canto pela paz

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